domingo, 22 de julho de 2012

Telefone celular como identidade

Se você não possui um celular você não existe! Simples assim. Todos perguntam a todos: qual o número do seu celular? Hoje em dia é quase que impossível preencher algum cadastro ou fazer alguma inscrição sem que se seja instado a fornecer o número de um telefone celular. O celular adquiriu representações e ganhou significados que transcendem a sua condição material: tornou-se uma espécie de documento, uma identificação pessoal. Tal condição, que é recrudescida devido ao uso do celular ocorrer de forma individual e não coletiva – como em um telefone convencional –, termina por ser constrangedora para pessoas que não possuem celulares, pois são tratadas como se fosse imperativo possuir um número. Por outro lado, há aquelas pessoas que usam aparelhos telefônicos com dois ou mais chips e, portanto, possuem mais de um número, que intrepidamente perguntam: você quer o número de qual operadora? Nesse caso, para fazer jus a sociedade pós-moderna, há várias identidades.
 
Referências Conexas
 
Horst, H., & Miller, D. (2006). The cell phone: an anthropology of communication. Oxford: Berg Publishers.

Miller, D. (1987). Material culture and mass consumption. Oxford: Blackwell.

quarta-feira, 18 de julho de 2012

Tequilada

Quando, de algum modo repercutindo o que antes apresentara Stephen Brown, os pesquisadores Fuat Firat, Nikhilesh Dholakia e Alladi Venkatesh escreveram sobre a sociedade pós-moderna e as experiências a ela relacionadas em termos de mercado, cultura e consumo, suponho que por mais que eles tenham pensado na centralidade do consumo para diferentes realidades de comunidades, eles não fizeram ideia de uma cena como essa da Tequilada na imagem acima: uma garçonete servindo tequila na boca de inúmeros clientes na casa noturna Happy News na cidade de São Paulo. Deu na Folha de S. Paulo! A música embala, a presença da garçonete ajuda e, embora poucos se conheçam, o frenesi por um gole de tequila é o que conta. Não é preciso muito para perceber que se trata de uma experiência que desconstrói consideravelmente noções anteriores a respeito de consumo em casas noturnas.

Esse post compõe uma série chamada "Web News". Trata-se de observações acerca de notícias relacionadas à cultura e consumo, publicadas na World Wide Web.

domingo, 15 de julho de 2012

Criatividade na apresentação de produtos orgânicos

 

Durante muitos anos produtos orgânicos ficaram à margem e constituíram um mercado pouco conhecido e valorizado. Por serem produzidos em menor escala, sobretudo por meio de agricultura familiar, e terem uma distribuição restrita, quase sempre tiveram um preço maior do que seus similares não orgânicos e durante um bom tempo foram tidos como sinônimo de produtos caros, tendo pouca demanda. Essa situação mudou consideravelmente hoje em dia. Embora não existam dados precisos, a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) estima que o consumo de produtos orgânicos cresça a uma taxa de cerca de 10% ao ano.


É natural que o aumento no consumo dos produtos orgânicos seja resultado de inúmeros fatores. Um deles, no entanto, parece estar vinculado à compreensão por parte dos produtores de que não basta que o produto seja saudável, é preciso, também, que ele seja agradável aos olhos. É isso, por exemplo, que produtores têm procurado fazer ao estimularem o consumo por meio de uma melhor apresentação dos produtos. E ao fazerem isso, não reinventam a roda, mas antes procuram usar elementos de cultura material que são referências para os consumidores, como é o caso da alface embalada em forma de um arranjo de flor nas fotos que fiz para este post, logo acima.
 
Referências Conexas
 
Camilo, A. N. (Ed.). (2011). Guia de embalagens para produtos orgânicos. Barueri: Instituto de Embalagens.
 
Miller, D. (Ed.) (1998). Material cultures: why some things matter. Chicago: University of Chicago Press.
 
Motta, S. L. S., & Rossi, G. B. (2001). A influência do fator ecológico na decisão de compra de bens de conveniência. Revista de Administração Mackenzie, 2(2), p. 109-130.
 
Portilho, F. (2008, junho). Consumidores de alimentos orgânicos: discursos, práticas e auto-atribuição de responsabilidade socioambiental. Anais da Reunião Brasileira de Antropologia, Porto Seguro, BA, Brasil, 26.

quarta-feira, 11 de julho de 2012

Artes e poesia no metrô

Não há livros de poesias em vitrines de livrarias. Se há, é fato raro, quase que único na paisagem das compras. E se a poesia não é consumida em caráter privado, por meio dos dispositivos de entrega convencionais do mercado, ela é consumida – ou oferecida ao consumo – em público.

Foi isso que aconteceu com “O Mistério O Tempo em Poesias”, exposição de caráter multimodal do artista Cacau Brasil, instalada na Estação Ipanema, Metrô Rio. O curioso é que como se fosse para fazer jus a sua proposta multiforme e de “não lugar”, tendo em vista o fato de ser itinerante, a exposição localizou-se entre duas importantes referências geográficas cariocas: a Praia de Ipanema e o Morro do Cantagalo.

Obs.: a foto acima é de um painel na Estação General Osório, Metrô Rio, em Ipanema, Rio de Janeiro, Brasil.

Esse post compõe uma série chamada "Nota de Viagem". Trata-se de pequenas observações realizadas durante viagens.

domingo, 8 de julho de 2012

Preconceitos da propaganda contra idosos

Dentro de poucos anos o Brasil não será mais um país jovem. Pouco se fala nisso, mas segundo dados do IBGE, 11% da população brasileira atual tem 60 ou mais anos de idade e esse percentual tende a aumentar a cada ano que passa. Conforme projeções do IBGE, divulgada após o mais recente Censo, em 2050 serão 65 milhões de idosos.

Esses dados colocam em perspectiva uma situação curiosa: pelo menos por enquanto, os idosos brasileiros não conseguem se ver nas propagandas veiculadas no país. Idosos possuem renda, consomem inúmeros produtos e serviços, mas quando os publicitários de plantão usam suas imagens associadas a práticas de consumo, em geral as usam para colocá-los, no máximo, como coadjuvantes. Em algumas situações, usam imagens que até mesmo causam constrangimento ou os ridicularizam, como nas propagandas da cerveja de marca Nova Schin na televisão ou do UOL em revista – no primeiro caso dois jovens são perseguidos por idosas e no segundo uma idosa demonstra lentidão no uso de equipamento eletrônico.

Em uma sociedade que valoriza a juventude e que tanto cultua a estética do corpo, como será a propaganda nos próximos anos? Idosos continuarão a ser ignorados, como se não existissem, não fizessem parte da população e não consumissem? O país do futuro está envelhecendo, mas, aparentemente, ainda não percebeu.

Referências Conexas

Camargo, L. O. de L., & Bueno, M. L. (2008). Cultura e consumo: estilos de vida na contemporaneidade. São Paulo: Senac.

Debert, G. G. (2003). O velho na propaganda. Cadernos Pagu, 21, p. 133-155.

Moschis, G. P., Mosteller, J., & Fatt, C. K. (2011). Research frontiers on older consumer’s vulnerability. Journal of Consumer Affairs, 45(3), p. 567-491.

Ursic, A. C., Ursic, M. L., & Ursic, V. L. (1986). A longitudinal study of the use of the elderly in magazine advertising. Journal of Consumer Research, 13(1), p. 131-133.

quarta-feira, 4 de julho de 2012

O Cheiro do Ralo

Não há sociedade sem materialidade. Os objetos que usamos e que estão presentes em nosso cotidiano representam essa condição. Compõem a cena doméstica – inclusive a paisagem urbana. Na maior parte do tempo, passam despercebidos e são lembrados quando necessários. Nesses casos, recebem sentidos, ganham significados e até se tornam símbolos. É algo inerente à cultura material.

O filme O Cheiro do Ralo (Brasil, 2007, Comédia/Drama, 112 minutos), direção de Heitor Dhalia, roteiro de Lourenço Mutarelli, Marçal Aquino e Heitor Dhalia, com Selton Mello e Paula Braun, revela de forma ímpar a transversalidade da cultura material em nosso cotidiano. Tal revelação ocorre de forma dolorosa por meio da transferência de posse dos objetos, que é algo central no enredo do filme. De modo estarrecedor, o filme trata de valor material, valor monetário e valor simbólico.

Trata-se de oportunidade para se observar significados que atribuímos aos objetos ao tê-los sob nossa posse e uso. É, também, uma ótima ocasião para verificar aquilo que outros lhe atribuem quando colocados em perspectiva de troca e comercialização e não apenas de uso. Dito de outra maneira, é uma excelente oportunidade para assistirmos de que maneira construímos e transferimos significados para os objetos – poderia até servir de ilustração para algumas das obras de Daniel Miller ou Grant McCracken.

Esse post compõe uma série chamada "Filme". Trata-se de sugestões de filmes.

domingo, 1 de julho de 2012

A bobagem da pegada ecológica


A Rio +20 terminou, muito se discutiu e mais uma vez, longe das atribuições de responsabilidades aos Estados membros da ONU (Organização das Nações Unidas), várias organizações que defendem a sustentabilidade voltaram suas baterias para o indivíduo, especificamente para o consumo de recursos naturais por parte dos indivíduos e, por conseguinte, de suas famílias. A capacidade que organizações como, por exemplo, a WWF (Fundo Mundial para a Natureza) possuem para responsabilizar o consumidor individual pelas condições do planeta, muitas vezes beira a falta de bom senso. As relações de consumo entre consumidores individuais e organizações empresariais, em termos de capacidade de agência, são absolutamente assimétricas. Atribuir, portanto, a responsabilidade pela salvação do planeta ao consumidor individual é algo, sem sombra de dúvidas, inócuo!

Na tentativa de mensurar e, por conseguinte, responsabilizar o consumo individual pelo uso de recursos e pela condição de sustentabilidade do planeta, a Global Footprint Network criou, tempos atrás, uma forma de calcular o que chamam de pegada ecológica. Trata-se de mensurar o quanto de recursos naturais cada indivíduo consome e qual é o impacto desse consumo – ou do estilo de vida do indivíduo – sobre o meio ambiente.

Mais importante, e necessário, seria focar sobre o consumo de recursos por parte de organizações empresariais – companhias nacionais, multinacionais e transnacionais – e o impacto sobre o meio ambiente decorrente desse consumo. Os vestígios ecológicos que consumidores organizacionais deixam são enormes e terminam por definir o tamanho e a intensidade das pegadas dos consumidores individuais.
 
Referências Conexas
 
Maia, G. L. &Vieira, F. G. D. (2004). Marketing verde: estratégias para produtos ambientalmente corretos. Revista de Administração Nobel, 2(3), p. 21-32.
 
Oliveira, J. S. & Vieira, F. G. D. (2008). Produção simbólica e sustentabilidade: discutindo a lógica da salvação da sociedade pela mudança nos modos de consumo. Caderno de Administração (UEM), 16(2), p. 35-43.