segunda-feira, 25 de abril de 2011

Pacientes são consumidores

Na semana passada, o Professor Paul Krugman escreveu no The New York Times que “pacientes não são consumidores”. Ele está completamente contrariado sobre como o mercado de serviços médicos tem sido moldado nos Estados Unidos. Infelizmente, o Professor Krugman está equivocado! Ele ganhou um prêmio Nobel, mas enganou-se nesta questão. O mercado tem ultrapassado diferentes fronteiras ao longo da história e a transformação de pacientes em consumidores não é uma surpresa. O conceito de consumo está além da compra de coisas materiais e a relação entre médicos e pacientes está longe de ser a mesma de antes. Por diferentes razões, o sistema de assistência médica tem sido visto como um mercado. Essa visão é compartilhada por diferentes agentes, entre eles os governos de vários países. Hoje em dia, a noção de welfare state parece ser uma piada ou ideia do passado. A rigor, o Estado não tem condições de oferecer serviços integrais de saúde às pessoas, mesmo que os responsáveis pelos governos costumem dizer que sim. Todos nós podemos estar envergonhados ou contrariados, mas é isso que tem acontecido. Voltando ao ponto inicial, um exemplo simples sobre a noção de pacientes como consumidores está relacionada ao mercado de cirurgia plástica. A maioria das pessoas que procura a cirurgia plástica não faz isso como paciente, mas como consumidor que procura fornecedores. O conceito de assistência médica, portanto, tem mudado substancialmente. Dessa forma, o resultado da compreensão e da concepção de pacientes como consumidores não é uma surpresa. Naturalmente, tal concepção pode ter inúmeras questões éticas a serem debatidas, mas não se trata de uma surpresa.

Referências Conexas


CHAVEAU, Sophie. Between gift and commodity: blood products in France. Economic Sociology Newsletter, v.11, n. 1, p. 24-29, 2009.

ROTH, Alvin. E. The art of designing markets. Harvard Business Review, v. 85, n. 10, p. 118-126, 2007.

SLATER, Don; TONKISS, Fran. Market society. Cambridge: Polity Press, 2001.

7 comentários:

  1. Cristãos também são Consumidores

    Se o mercado se adapta com as crenças religiosas das pessoas, por que não pode se adaptar também com as necessidades de saúde das pessoas?

    Ontem foi finalizado um ciclo cristão que envolveu um gigantesco mercado, o de alimentos. O mercado de carnes, de todos os tipos, é influenciado pela fé da população católica, maioria no Brasil. Além das carnes o chocolate também moveu alguns milhões nos últimos meses.

    As fronteiras entre o mercado com setores da educação, saúde, política e religião são bastante confusas.

    Todavia, o capitalismo vem engolindo tudo o que vê pela frente, o mercado da saúde é apenas mais um.

    Vitor Nogami

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  2. Essa reflexão lembra o texto de Bauman sobre o capitalismo parasitário. Não acho que o mercado se adapta com as crenças das pessoas, mas as crenças das pessoas que adaptaram a uma lógica de mercado. E isso, de fato, não é nenhuma novidade, como salienta o post do professor. Já naturalizamos as pessoas como sujeitos, as relações como negócios, e os filhos como investimentos. Por que não a doença como um mercado?

    Excelente proposição de reflexão professor!!! Esta discussão nos leva muito além do que uma consulta médica.

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  3. Caro colega Anônimo,

    a discussão sobre o mercado se adaptar às crenças das pessoas, ou, as crenças das pessoas se adaptam à uma lógica de mercado, é bastante válida. Porém, neste caso (saúde), acredito que o mercado se adequou, uma vez que os plano de saúde estão cada vez mais agressivos na captação e fidelização dos pacientes/clientes.

    As campanhas dos planos de saúde cercam todos os meios de comunicação, todas as faixas etárias, muitas regiões e cada vez mais à população de baixa renda também, ou seja, tem se adequado ao estilo de vida das pessoas/consumidores/pacientes.

    Na minha próxima consulta médica, vou procurar me identificar mais como consumidor do que paciente, para tentar notar mais alguns aspectos que envolvem o setor da saúde como um mercado!!

    Um abraço,

    Vitor Nogami

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  4. Caro Francisco,

    A visão de Krugman realmente parece retrógrada. É como se ser cliente fosse ser desrespeitado. Apesar das incontáveis vezes em que isto ocorre, não é o que aprendemos quando ainda cursávamos Marketing I na faculdade: atender às expectativas, preferencialmente superá-las. Ao mesmo tempo, algumas áreas ainda tratam a relação de consumo como algo ligado somente à transação comercial. É comum, por exemplo, pessoas da área de ensino (na presunção de estarem sentadas ao lado de Deus) se revoltarem ao tratar o mercado, composto de empresas e alunos, como mercado.
    Amplexos, EDSON.
    www.marcatwain.blogspot.com

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  5. Prezados Vitor, Edson e 'Anônimo',

    Obrigado pelos comentários.

    Abraços,

    Francisco Giovanni

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  6. Não ficou claro - e ignoro o texto do Krugman - se o que se tem é uma defesa por algo que é assim, mas deveria ser diferente, ou uma simples constatação equivocada por parte dele, como sugere o nobre e amigo professor Giovanni. De qualquer modo, o problema todo está em que as relações de mercado envolvem, necessariamente, a contrapartida financeira por parte do usuário: eu tenho direitos quando posso dar a contrapartida em dinheiro, isto é, quando posso pagar. Eis então o problema, porquanto educação, saúde, e muitas outras necessidades, não podem se apresentarem como direito apenas daquela parte da população que pode pagar por elas. São direitos básicos que ultrapassam - por necessidade da própria sociedade, e não apenas do ser humano em sua individualidade - a barreira da sujeição ao poder de barganha.
    João Marcelo Crubellate.

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  7. Obrigado pela visita, Crubellate!

    O link para o texto do Krugman está no próprio post (onde se lê New York Times). Não apresento uma defesa no post de que os pacientes deveriam ser consumidores em função da falência das posibilidades de oferta de serviços de saúde e educação por parte do Estado. A questão sugerida no post transcende o pagar ou o não pagar pelos serviços, bem como a concepção (possível mas não provável em tempos pós-modernos) de que são um direito dos indivíduos. O consumo, enquanto categoria de análise, no caso, vai além do caráter da oferta dos serviços. Como tal, por conseguinte, independe da relação entre estrutura e agência. Existe como prática (fato) social! Nesse sentido, os pacientes são consumidores.

    Um abraço,

    Vieira

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