domingo, 17 de janeiro de 2016

O coletivo individual



"Socializar riscos, privatizar lucros". Essa frase que tanto tem se aplicado ao mundo das corporações nas relações com o Estado serve perfeitamente para o futebol. Por que um esporte que é coletivo privilegia tanto o individual? Como um esporte que é coletivo elege um melhor, se cada jogador exerce uma função diferente e, de algum modo, o êxito de um depende do outro? A quem interessa a eleição do melhor? 

O prêmio do melhor jogador é sempre, ou quase sempre, dado a quem é atacante e a quem faz gols - muitos gols. Quem corre, quem faz a cobertura, quem desarma o adversário e quem evita a derrota é chamado de brucutu. Quem faz o gol ser possível, ou seja, quem faz a assistência - a jogada e o passe para o gol - é pejorativamente chamado de garçom. Mesmo Samuel Rosa e Nando Reis, quando dizem que o meio campo é o lugar dos craques, sugerem que o centroavante é o mais importante - e aí o centroavante é sinônimo de gol.

Nunca um desarme será tão aplaudido ou festejado quanto um drible, muito menos uma defesa quase impossível, feita por um goleiro, será celebrada como um gol. Atacante erra várias vezes, perde gol embaixo da trave e praticamente nada acontece. Um zagueiro que não corta uma bola e um goleiro que toma um frango serão sempre criticados ou mesmo estigmatizados.

Em que pesem a magia e alegria de ser o esporte mais praticado em todo o mundo, o futebol é repleto de equívocos criados e geridos por instituições como a FIFA (Fédération Internationale de Football Association) e as federações nacionais. Tais equívocos são largamente apoiados pela indústria cultural. A eleição do melhor jogador do mundo, ao transformar o coletivo em individual, parece ser um deles.

Referências Conexas

Blumrodt, J., Bryson, D., & Flanagan, J. (2012). European football team's CSR engagement impacts on customer-based brand equity. Journal of Consumer Marketing, 29(7), 482-493.

Brendan, R. (2004). New consumers and football fandom: the role of social habitus in consumer behaviour. Irish Journal of Management, 25(1), 88-100.

Chade, J. (2015). Política, propina e futebol: como o "padrão FIFA" ameaça o esporte mais popular do planeta. Rio de Janeiro: Objetiva.

Ferraz, P. (2011). Futebol e comunicação, um processo de consumo chamado paixão. Organicom, 8(15), 107-123.

Ribeiro Jr., A., Cipoloni, L., Azenha, L. C., & Chastinet, T. (2014). O lado sujo do futebol: a trama de propinas, negociatas e traições que abalou o esporte mais popular do mundo. São Paulo: Planeta do Brasil. 

Wicks, P. G., Nairn, A., & Griffin, C. (2007). The role of commodified celebrities in children's moral development: the case of David Beckham. Consumption Markets & Culture, 10(4), 401-424.

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