domingo, 27 de outubro de 2019

Assaltos constroem mercados




A imagem que está logo acima é um print screen da tela do meu celular. Nela há uma mensagem que me foi enviada pelo Banco do Brasil oferecendo o que identifica como seguro cartão protegido. Trata-se de uma cobertura de seguro que garante reembolso em caso de ocorrência de assalto e "saidinha de banco" no intervalo de até uma hora após o saque efetuado no banco. 

A oferta desse tipo de seguro é algo bastante curioso. É como se houvesse uma espécie de institucionalização do assalto na saída de bancos. A existência do assalto na saída de banco passa a ser uma oportunidade para o banco oferecer um novo serviço aos seus clientes. Lucra-se com a incerteza, a insegurança e o medo.  

Alguém pode ficar imaginando que, sob a perspectiva do banco, quanto maiores forem os problemas de segurança pública, maiores serão as possibilidades de o banco vender novos seguros. Em outras palavras, podemos dizer que assaltos na saída de bancos produzem novos serviços e formatam mercados. 

Talvez esse caso possa servir como ponto de partida não só para a observação de fenômenos de consumo que são engendrados em torno da sensação de medo, como também para a observação de mercados que são construídos em torno do sentimento de insegurança.

Referências Conexas

Callon, M., & Muniesa, F. (2005). Economic markets as calculative collective devices. Organization Studies, 26(8), 1229-1250.

Davis, G. F. (2009). Managed by the markets: how finance reshaped America. Oxford: Oxford University Press.

Dillard, J. P., & Anderson, J. W. (2004). The role of fear in persuasion. Psychology & Marketing, 21(11), 909-926.

Geiger, S., & Gross, N. (2018). Market failures and market framings: can a market be transformed from the inside? Organization Studies, 39(10), 1357-1376.

Zwick, D., & Cayla, J. (2011). Inside marketing: practices, ideologies, devices. Oxford: Oxford University Press.

quinta-feira, 24 de outubro de 2019

Onde está o pau de selfie?



Ele foi lançado no mercado e virou motivo de alegria para muita gente.
Tornou-se um instrumento para o consumo da imagem.
Um acessório a serviço do culto à vaidade.
Onde ele está?
Veio e foi?

sábado, 19 de outubro de 2019

O McDonald's quer ser Méqui: uma apropriação cultural?



Depois de 40 anos e 1.000 lojas no Brasil, o McDonald's quer ser Méqui! Não quer parecer ser um estrangeiro inacessível, mas sim um gringo conhecido. Tenta explorar a ideia de que brasileiros são pessoas informais e que, sobretudo os mais jovens, costumam chamar aqueles que lhes são mais conhecidos por um nome abreviado. 

Como sabemos, a linguagem não é usada só para comunicação. Ela é um meio de conexão, aproximação e conquista. O McDonald's sabe disso muito bem. Usar um diminutivo aportuguesado para o seu nome é uma maneira clara e objetiva tanto de estabelecer uma conexão, quanto de tentar criar afeto. Não é à toa que seu slogan é amo muito tudo isso. Como se não bastasse, o nome Méqui em nada parece lembrar o nome de um vilão ou símbolo do imperialismo americano, durante muitos anos associado ao McDonald's.

Talvez se possa pensar que o McDonald's desenvolve um processo de apropriação cultural no Brasil. Afinal, além do nome Méqui, tem adaptado e oferecido produtos que possuem importante referência cultural para brasileiros, como o pão de queijo e o hambúrguer feito com carne de picanha, por exemplo. 

A questão é que se alguns podem enxergar apropriação cultural nas ações do McDonald's, e com isso elementos de superioridade, domínio e uma forma contínua de colonização, outros podem ver capacidade analítica e compreensão do mercado brasileiro, e com isso adequação e adaptação mercadológica. O que você acha?

Obs.: a foto acima é da fachada de uma loja do McDonald's na Avenida Paulista, 2034, na cidade de São Paulo, Brasil.

Esse post compõe uma série chamada "Nota de Viagem". Trata-se de observações realizadas durante viagens.

Referências Conexas

Money, A. (2007). Material culture and the living room: the appropriation and use of goods in everyday life. Journal of Consumer Culture, 7(3), 355-377.

Roberts, K. (2005). Lovemarks - o futuro além das marcas. São Paulo: M. Books.

Rodriquez, J. (2006). Color-blind ideology and the cultural appropriation of hip-hop. Journal of Contemporary Ethnography, 35(6), 645–668.

Suh, Y., Hur, J., & Davies, G. (2016). Cultural appropriation and the country of origin effect. Journal of Business Research, 69(8), 2721-2730.

Young, J. O., & Brunk, C. G. (2012). The ethics of cultural appropriation. Oxford: Wiley-Blackwell.

quarta-feira, 16 de outubro de 2019

Uma flor para mais respostas



As dissertações, teses e artigos brasileiros que tenho lido no campo de estudos de consumo quase não usam artigos publicados em revistas especializadas em métodos e procedimentos de pesquisa - parece que temos o hábito de usar manuais consagrados. Por força do ofício, de vez em quando eu procuro passar o olho nessas revistas e há algum tempo me deparei com um artigo curioso que faz pensar sobre como aquilo que pesquisadores usam como tipos de indumentária, acessórios ou ornamentos, podem influenciar na abordagem e interação junto a pessoas convidadas a participarem em pesquisas. Trata-se de um artigo publicado em 2015 na revista Field Methods, que descreve como o uso de uma flor no cabelo, por parte de uma mulher, pode produzir maior adesão e resposta positiva a um convite para participação em pesquisa. Vale a pena a leitura do artigo. A indicação está abaixo.

Stefan, J., Jacob, C., & Guégen, N. (2015). The interviewer wore a flower in her hair: the effect of hair ornamentation on compliance to a survey request. Field Methods, 27(4), 363-372.

Esse post compõe uma série chamada "Olhar Acadêmico". Trata-se de breves observações realizadas sobre trabalhos acadêmicos na forma de artigos, dissertações, teses ou livros relacionados direta ou indiretamente a cultura e consumo.

segunda-feira, 14 de outubro de 2019

Leituras sobre Rock and Roll




O Rock in Rio 2019 terminou alguns dias atrás, mas quem gosta de rock não precisa, necessariamente, ficar alimentando a nostalgia da experiência vivida in loco ou da experiência de assistir aos shows por meio da TV. Tampouco carece de já começar a imaginar como será o próximo festival. Na verdade, as duas coisas são perfeitamente possíveis, e até se completam. Porém, há uma outra maneira de continuar vivendo o mundo do rock, ou se permitir descobrir coisas que em um primeiro momento talvez não estejam tão aparentes em seu universo musical. Refiro-me à experiência de leitura de dois livros escritos por Daniel Rezende e disponíveis para compra em forma de e-book na Amazon. 

Daniel Rezende é professor universitário no Departamento de Administração e Economia da Universidade Federal de Lavras, Minas Gerais, e pesquisador no campo de estudos de consumo e mercados. É apaixonado por rock, e nas horas vagas tem o hábito de escrever sobre o assunto. Os dois livros que publicou são extremamente convidativos à leitura, sobretudo porque além de bem escritos, fogem do lugar comum. 

Um livro tem o título de Rock Feminino, e contem 43 indicações que começam em 1964, com The Ronettes, e vão até 2017, com St. Vincent. O livro é uma celebração do talento e brilhantismo feminino no mundo do rock. 

O segundo livro tem o título de Rock Alternativo: 50 álbuns essenciais. Como o próprio título sugere, trata-se de 50 indicações daquilo que não se pode deixar de ouvir. Fazendo uma espécie de trocadilho com o título do livro, parece que o essencial é a essência em termos de inquietação e criatividade no rock. 

Os livros representam um verdadeiro achado para amantes do rock!